A prisão a que se submete injustamente o cabo Jeoás Nascimento neste momento não corresponde para nós, membros da caserna nenhuma novidade. No interior dos quarteis não há espaço para ampla defesa e contraditório e diferente da justiça comum, que só prende um meliante, por mais “cabeludo” que seja o seu delito, com provas e mais provas, testemunhas e mais testemunhas, e depois de se esgotarem todas as chances de o soltar, no quartel, não necessita-se de provas, muito menos de testemunhas para se prender e “açoitar” com os grilhões da impunidade, quaisquer “cristo” que se meta a redentor.
Primeiro você é preso, e depois, você tenta provar sua inocência. É bem o oposto da que se aplica pela justiça comum.
Mas, vamos a nossa infinita masmorra, uma vez que estamos todos presos. A prisão que acorrenta neste momento nosso irmão de luta e de farda, na verdade é apenas uma das tantas prisões que acorrentam os homens de bem, e os pretensos reformadores desse infame sistema de coisas ao longo da história.
Não é de hoje que não podemos expressar nossas ideias e nem mesmo lutarmos por aquilo que acreditamos ser nosso direito, ao longo da história teríamos vários exemplos a citar, o que se torna desnecessário para não sermos redundantes.
Quantas vezes nós policiais de baixa patente não ouvimos o superior encher o pulmão do oxigênio da arrogância e dizer-nos: tá ponderando praça? E aí nós saímos calados, trêmulos a espera de um libelo acusatório em função de termos discordado de algum absurdo ou mesmo sugerido uma mudança necessária em determinada ordem que contrarie a razão.
Quantas vezes não ficamos presos, confinados no interior de uma escola por que um fio da nossa barba escapou da lâmina do barbeador ou por que nosso lençol estava com uma dobra a mais ou a menos sobre a cama da academia?
Quantos não já foram presos e punidos com a queda do comportamento por ter se expressado em um canal de TV, jornal, ou Blog e se mostrado contrário a esse regime de ditadura vergonhoso que perdura nos quartéis do todo brasil até hoje?
Se não bastasse o regulamento disciplinar da policia militar está ultrapassado, ainda há o famoso R-QUERO, que se constitui num regulamento suplementar, que não encontrando uma brecha pra punir pelo que chamam legal, pune-se por este último, que é ainda mais “castrense” e permite a punição da forma que o superior quer, ou deseje.
As amarras desse sistema de dominação que favorece a classe superior em detrimento da maioria dominada são legitimadas pelos seus próprios mecanismos. Já falamos disso antes, e agora retomemos: a classe dominante tem no aparato de segurança pública seu braço armado e seus fiéis escudeiros, para que assim mantenha-se a ordem necessária para a estabilidade da burguesia no poder e a reprodução dessa ideologia de massa que sufoca o trabalhador, lhe oferecendo pão e água, no sentido literal do termo, e negando-lhe pela condição de submissão o direito de reclamar.
O direito de chorar de fome, pois se assim o fizer será contido pela própria força da qual faz parte e conduzido ao calabouço da insensatez.
Hoje somos encurralados. Vemos colegas armados e de cara dura guardando o furto mais vergonhoso que se pode furtar: o furto da nossa liberdade. Os companheiros que empunham o fuzil para evitar a nossa fuga, são prisioneiros do mesmo sistema. E o pior, acham isso normal, e alguns até se envaidecem de tamanha missão, pois a “lavagem cerebral” a que foram submetidos, ensinou-lhes certamente a ser um militar “padrão”.
E ser um “militar padrão” passa pela subserviência e pela não ponderação. Passa por cumprir a ordem, mesmo que seja absurda, sem contestação, afinal, para estes, “missão dada é missão cumprida.”
A constituição democrática, elaborada para comemorar a queda dos militares do poder no final da década de 80 do ano 1900 é a mesma que dá aos militares a condição de autônomos para decidirem sobre a vida particular, a vida econômica e financeira, aspectos da vida familiar e por fim o bem maior do ser humano, que não é a vida e sim a liberdade.
Estamos na verdade todos presos, e se para a sociedade somos exemplo de força e de autoridade, no interior de nossa casa (leia-se) quartel, somos frágeis peças de um sistema corroído, fadado ao fracasso por insistir em não acompanhar a evolução da humanidade, nos aspectos sociais, tecnológicos, filosófico-racionais e acima de tudo no direito, que avança num processo evolutivo necessário, abraçando demandas cada vez mais intensas para garantir ao homem o direito de mesmo segregado pela classe dominante, ter o direito ao menos de “chorar de fome”, principalmente quando essa fome tenha ultrapassado os limites da fome de pão e alcançado o vértice da fome e sede de justiça e liberdade.
Da fome até mesmo da palavra. Pois a liberdade de expressão garantida pela constituição democrática, também tem sido castrada pelo militarismo em vários exemplos que se arrastam ao desde o advento de sua promulgação.
As algemas que nos amarram são as algemas da ignorância e da falta de razão, essas são mazelas sociais que perseguem a humanidade desde seus primórdios: a matança de Sócrates, a condenação de Galileu, a queima de Giordano Bruno, a crucificação de Jesus Cristo, o esquartejamento de Tiradentes, a prisão de Jeoás são apenas a repetição da história ao longo dos séculos.
Não esqueçam: ainda ontem evoluímos do estúpido macaco!
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