TRF-5 livra Alemão de 80 anos de condenação
DEMITRI TÚLIO. demitri@opovo.com.br
O
líder do milionário furto do Banco Central (BC) de Fortaleza, Antônio
Jussivan Alves dos Santos – o Alemão, não cabe em si de satisfação. E
não é para menos. Uma decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região
(TRF-5), em Recife (PE), o livrou da condenação de 80 anos, 10 meses e
20 dias de prisão em regime fechado. É isso mesmo. O TRF-5 extinguiu, no
último mês, a pena por “lavagem de dinheiro praticado por organização
criminosa”, aplicada pelo juiz Danilo Fontenele da 11ª Vara Federal.
Para
tentar impedir que Alemão saia quase impune do crime que sumiu com
perto de R$ 165 milhões da caixa forte do BC, a Procuradoria Regional da
República da 5ª Região (PRR-5) decidiu recorrer da decisão do TRF-5. Um
constrangimento jurídico entre Recife e Fortaleza. A PRR-5, que
protocolou petição no último 24 de janeiro para tentar correr atrás do
prejuízo para a sociedade, foi contrária à denúncia feita em 2015 pelo
Ministério Público Federal no Ceará. E recorreu agora, após concordar
com o fim da condenação do assaltante pela “lavagem” do dinheiro
roubado.
A extinção foi defendida pelo desembargador federal
Paulo Roberto de Oliveira Lima, relator do processo e teve a
concordância da procuradora Maria do Socorro Paiva e dos demais
integrantes da turma. O magistrado se convenceu, baseado na argumentação
da advogada Erbênia Rodrigues, que Alemão era o injustiçado de parte da
história do furto ao Banco Central, ocorrido em 2005.
O
assaltante nascido em Boa Viagem (CE), segundo entendimento do TRF-5,
foi condenado por lavagem de dinheiro por organização criminosa, crime
que não estaria “tipificado” entre 2006 a 2008. Período em que a equipe
do delegado federal Antônio Celso monitorou e esmiuçou como Alemão e 30
“laranjas” fizeram para lavar parte da cota recebida na partilha do
furto milionário. De acordo com o delegado, o assaltante teria recebido
mais de R$ 10 milhões.
Em juízo, Alemão confessou ter ficado
com R$ 5 milhões. Dinheiro “lavado” em móveis e imóveis (veja lista)
entre Brasília, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Segundo
Erbênia Rodrigues, a definição do delito de lavagem de dinheiro
praticado por “organização criminosa” só ocorreu com a vigência da Lei
12.850/2013. Por enquanto, o ato do TRF-5 favorece apenas a Alemão. Mas
beneficiará mais de uma centena de condenados que “lavaram” parte dos
milhões roubados do BC e ainda abrirá outros precedentes.
Agora,
a advogada aguarda informações da Penitenciária de Pacatuba, cadeia
cearense onde Alemão está desde 2008, para pedir a progressão do regime
do cliente. Com a decisão do TRF-5, ele só não será solto de imediato
porque responde ainda por pelo menos três processos (veja entrevista com
a advogada).
Com o fim da pena por lavagem de dinheiro,
restaria a Alemão a condenação de 49 anos e dois meses de prisão em
regime fechado por furto qualificado e outros delitos menores. Mas, como
o TRF-5 já havia diminuído a sentença para 35 anos e 10 meses, o tempo
de presídio pelo BC já foi. Preso desde 2008 pelo furto, cumpriu 1/6 da
pena, tem bom comportamento e já poderia estar respondendo em
liberdade.
Nos bastidores da Justiça Federal, na
Procuradoria da República no Ceará e entre procuradores do Banco
Central, a piada corrente, e ao mesmo tempo incomoda pela sensação de
impunidade, é a de que o crime contra o BC compensou para Alemão e para
sua organização criminosa.
TRF-5 HAVIA RECONHECIDO O CRIME
O
juiz Danilo Fontenele, da 11ª Vara Federal de Fortaleza, não quis
comentar a decisão do TRF-5 e a concordância do MPF em extinguir a
condenação de Alemão por lavagem de dinheiro. Ficou “surpreso”, mas se
disse impedido legalmente de opinar sobre a dispensa de uma pena de
mais de 80 anos para quem “lavou” parte dos milhões furtados do Banco
Central, em Fortaleza.
Para fundamentar a aplicação da pena
de lavagem de dinheiro por organização criminosa, na sentença de
21/8/2015, disponível na Internet, Danilo Fontenele relaciona não só
legislações e documentos da doutrina jurídica brasileira, mas também
internacional, da qual o Brasil é signatário.
O Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) tem a Resolução 03/2006 que recomenda aos
tribunais que especializem varas em crimes praticados por organizações
criminosas. Uma resolução, portanto, anterior a Lei 12.850/2013, que
criou o crime de lavagem por organização criminosa.
O CNJ,
mesmo antes da lei de 2013, reconhecia que o conceito para lavagem de
dinheiro por organização criminosa era também da Convenção de Palermo
(Itália), que colocou centenas de mafiosos na cadeia. Convenção da qual
o Brasil é signatário e sempre fez uso dela.
Os
desembargadores do próprio TRF-5, segundo fundamentação da sentença
(página 22, item 84), atestaram o “reconhecimento de que o furto ao
Banco Central fora perpetrado por uma organização criminosa (…)
devidamente configurada e reconhece-se o delito de branqueamento de
valores”.
Danilo Fontenele escreve na sentença que embora a
legislação não defina o que seja organização criminosa, a Lei 9.034/95
regula os meios de provas e procedimentos de investigação com relação a
crimes praticados por “quadrilha ou bando ou organizações ou
associações criminosas de qualquer tipo”.
Segundo a
sentença, o grupo que executou o furto ao BC “configura uma verdadeira
organização criminosa. Tendo empreendido esforços, recursos financeiros
de monta, inteligências, habilidades e organização de qualidade
superior em empreitada criminosa altamente ousada e arriscada”.
O grupo, escreve ainda o magistrado, “dispunha de uma bem definida
hierarquização com nítida separação de funções, apurado senso de
organização, sofisticação nos procedimentos operacionais e instrumentos
utilizados, acesso a fontes privilegiadas de informações de dentro do
banco (empregados ou ex-empregados terceirizados), e um bem definido
esquema posterior de branqueamento dos capitais” roubados do Banco
Central.
ALGUNS BENS COMPRADOS POR ALEMÃO
IMÓVEIS
Um imóvel residencial em Boa Viagem, no Ceará
Uma mansão às margens da represa de rio Manso, em Nobres (Mato
Grosso)Uma propriedade rural no distrito de Bom Jardim, Nobres (Mato Grosso)
Uma casa no conjunto Riacho Fundo II, no Distrito Federal
Uma fazenda em Cocalzinho (Goiás)
Dois postos de combustíveis em Nova Andradina, Mato Grosso do Sul
Uma casa no bairro Poções, em Cuiabá (MT)
Uma fazenda de criação de animais, Mato Grosso do Sul
Um terreno localizado em Nova Andradina/MS
Dois imóveis no Recanto das Emas (Distrito Federal )
Total: 12 imóveis
MÓVEIS
Uma lancha Marajó 17, marca Levefort
Um Fiat/Siena, 2008, placas JHR-7795/DF
Um Fiat/Strada Advent, 2005, placas JFQ-1633/DF
Um Gol 1.0, 2006, placa NGB-5766/ DF
Um reboque de caminhão
Um Crossfox, 2006, placa JHA-2936-DF
Um Gol 1000, 1994, placas BOG-5528/SP
Um Polo 1.6, 2002, KEQ-2540/PR
Um Gol Special, 2004, AMC-2437/MS
Uma Honda NRX150, 2004, JZX-7152/MT
Um Ford/F350 G, 2005, ANC-4397/MT
Uma Honda/CG 150, Titan ESD, 2007, HSV-9778/MS
Um Fiat/Palio WK Adventure, 2007, HSY-1793/MS
Um I/GM Classic Spirit, 2007, HTA-0548/MS
Um reboque/Disnautica, 2007, KAR-1264/MT
Um Gol 16V Power, 2002, DFH-6619/DF
Um Jet Sky, Yamaha, inscrição número 401M2006005666
Uma camioneta Toyota Hilux CD 4x4, 2005
Telefones da Nextel, DF
Um Trator Ford, 7610, chassi V238458/MT;
Total: 19 móveis e telefones
Fonte: O povo
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